TEMPLE OF VOID: QUANDO DEATH METAL E DOOM METAL COLIDEM

Estados Unidos, uma nação crucial para o death metal. Não só a pátria de alguns de seus principais precursores (Possessed, Death), como também de dois dos cenários que mais conquistaram aficionados e influenciaram novas bandas ao redor do planeta: o da Flórida (Deicide, Morbid Angel) e o de Nova York (Suffocation, Incantation, Cannibal Corpse) – isso sem contar outros nomes de vital importância, surgidos tanto nesses dois centros quanto no resto do país. A história do estilo erigiu monumentais capítulos ali – e um dos segredos da resistência é sempre revigorar os participantes dessa narrativa: vemos agora nascer mais uma geração de grupos norte-americanos, que traz à frente a fidelidade lupina ao trabalho de seus ancestrais, porém com liberdade suficiente para incorporar o que bem entenderem. O Blood Incantation é até o momento o mais proeminente de todos: seu “Hidden History of the Human Race” provocou um terremoto entre os iniciados que não víamos desde oAmongst the Catacombs of Nephren-Ka” do Nile, lançado em 1998. Junto a eles, uma boa leva de conjuntos promissores (Horrendous, Necrot, Outer Heaven, Mortuous, etc), e também um quinteto, já em seu terceiro disco e assunto dessa resenha: o Temple of Void.

O primeiro álbum desses cidadãos de Detroit, “Of Terror And The Supernatural”, mostrava uma banda com um estilo já definido, ambicioso dentro de sua proposta de fazer o death mais doom possível (ou vice-versa), trabalhando com uma profundidade sonora que mostra que as freqüentes comparações com o Bolt Thrower funcionam somente como referência, pois a música de ambas é essencialmente diferente (o BT ainda encontra raízes no punk/HC inglês, sua música possui certa simplicidade “true” distante da sofisticação quase-progressiva do ToV). No segundo, “Lords of Death”, deixa-se as experimentações um pouco de lado em prol de um som lodoso, com uma parede de guitarras impenetrável e vocais tiranicamente lentos, a perfeita representação de como o termo “DeathDoom” deva soar – tipo se o Immolation resolvesse se apropriar dos momentos menos góticos de um Paradise Lost iniciante para dali moldar sua própria personalidade. A progressão em busca de uma densidade sonora absoluta é marcante, o que faz do Temple of Void um conjunto único desde o início: nenhum grupo death que você conheça se aproxima de forma tão bruta do doom metal; enquanto que nenhuma formação doom do mundo soa tão death (raiz) quanto eles. O que esperar de um terceiro registro, então? A resposta está em “The World That Was, que confirma algumas prévias certezas e aproveita também para apresentar novidades.

As certezas: resgata-se a preocupação com arranjos e texturas do primeiro álbum (coisa que se confunde com o death metalmoderno” desde a consagração do Opeth, mas é algo herdado do doom, já que My Dying Bride e o acima citado Paradise Lost incorporaram essa ideia ao som pesado muitíssimo antes), e também as guitarras massivas do segundo, em um som que nunca deixa de ser norte-americano na essência (traz à mente bandas que buscavam obter efeito sepulcral com ritmos moderados, como um Broken Hope), mas que possui alcance muito mais amplo, fantasmagórico em sua idealização e épico em sua execução. Se o Temple of Void optou pelo death metal, é porque sabe que o estilo existe para musicar o horror – e a presença do doom amplifica ainda mais o talento dos caras para dilatar a atmosfera punitiva de suas canções. Mesclar os dois estilos não é à toa, portanto: ser primal e clássico ao mesmo tempo, monstruoso e imponente, original porém tradicional, é sua qualidade maior. Até a curta vinheta instrumental “A Single Obolus”, um número acústico gótico-flamenco, pulsa com essa dualidade: mesmo que contenha inegável beleza, carrega consigo a angústia de um destino implacável. A majestosa faixa-título, provavelmente a melhor composição da carreira da banda e tomo final de “The World That Was”, ainda coloca novos elementos à mesa: a melodia que permeia o tema e sua atmosfera melancólica tem algo de funeral doom, o que talvez nos dê pistas para rumos futuros – fecho brilhante de um disco notável, de um nome sempre à altura dos desafios que institui para si mesmo. Coisa rara.

Aguarde para breve entrevista exclusiva com o Temple of Void aqui no Monophono.

Ouça “The World That Was” completo no YouTube:

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