EDDIE VAN HALEN, MORTO AOS 65 ANOS: O HOMEM QUE ELETRIFICOU O PLANETA



O falecimento de Eddie Van Halen não nos resguardará de nenhum clichê. Um dos mais utilizados até o momento é o “maldito 2020”, como se a morte de alguém fundamental ou importante não ocorresse em nenhum outro ano (mesmo os gênios se veem atropelados pela vacuidade das redes sociais), mas também os atributos técnicos do guitarrista receberão basicamente os mesmos tratamentos nas muitas colunas e obituários que pipocarão em nossas linhas do tempo, seja em veículos leigos ou especializados, ditos por colegas de profissão tão gigantes quanto ele ou por fãs anônimos ainda em estado de comoção: “revolucionário”, “expandiu o vocabulário do instrumento”, “o maior desde Hendrix”, “influenciou gerações”, coisas assim. Tudo a mais pura verdade, claro – porém, se o próprio Eddie, ao empunhar uma Frankestrat ou sua marcante EVH 5150, sempre tentou ir além do que se espera de um simples instrumentista, procuremos sair desse monte de palavras de ordem que tantos repetirão a esmo para buscar outros significados naquilo que esse fenomenal cidadão nos legou em sua vida artística.



Eddie ensinou que pouco adianta ter habilidade fora do normal se a ideia é fazer parte de uma banda: sua cabeça precisa estar voltada primordialmente à concepção de canções, a funcionar em conjunto, a também cumprir tarefas à primeira vista burocráticas, e isso de forma alguma significa limitar-se ou castrar-se – pelo contrário: ajuda a desenvolver aptidões, ao mesmo tempo em que se forja uma assinatura pessoal. Se as composições do Van Halen se mostravam estruturalmente programáticas, parte de uma tradição funcional de riffletrarefrãosoloriffletra instituída dentro do rock desde Chuck Berry, era natural para o guitarrista ajudar a alimentar esse esquematismo; e só então, através dele e nunca apesar dele, adicionar a complexidade que tanto o notabilizou. Dentro da combinação de ritmo e melodia temos o espaço de uma vida, afinal: ali convivem pragmatismo e fantasia, rotina e delírio, festa e melancolia, malabarismo e contenção – e o melhor VH passeava por tudo isso com desenvoltura e despojamento, atingindo sem distinção tanto o esteta exigente quanto o ouvinte fugaz.



Também mostrou que revolução é algo físico. Uma de suas marcas registradas eram as performances de palco aeróbicas – e por quê? Porque Eddie não encarava sua função como entertainer, acostumado a arenas e a mobilizar grandes audiências, apenas como a utilitária reprodução de notas e acordes registrados anteriormente em um álbum: seu corpo, nesses momentos, tornava-se a manifestação de uma alma completamente energizada pela música, se via tomado por um transe convulsivo de absoluta satisfação, entregue a uma comunhão tão única (e rara) com seu instrumento que ambos se tornavam um vulcão selvagem, em plena atividade magmática. “Eruption”, sugestivamente intitulada e um dos temas que solidificou para sempre sua lenda, simbolizava não apenas pleno domínio técnico, mas a transformação que tocar guitarra efetuava em seu criador: um sujeito, cujos dedos corriam mais rápido que a luz, inteiramente eletrificado por aquilo que fluía de suas mãos. A partir dele, passamos a identificar a real passionalidade, a que surge do âmago para a superfície, transmutada em magia.



Não poderia ter escolhido outra forma de homenagear o cara: esse vídeo ao vivo de “5150”, visto pela primeira vez quando era adolescente e impactante até hoje, mostra Eddie em plena forma, sorridente, elétrico, simplicidade à toda prova, solando feito um capeta, satisfeito ao assistir Sammy Hagar plenamente confortável em sua turnê de estreia à frente do grupo, e evidentemente sem graça quando surge uma faixa que o proclama “rei da guitarra”… São características que ajudaram Eddie Van Halen a conquistar o planeta – e pelas quais merece ser eternamente lembrado.

“5150” ao vivo em 1986:



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