MOPHO: QUATRO MOMENTOS DO GENIAL RAPHAEL RABELLO, NOS 27 ANOS DE SUA MORTE


Caçula de uma família de nove filhos, prodígio cuja habilidade descomunal ao violão se descobriu já na primeira infância, gênio que através de um estilo (o choro, no qual era especialista) expandiu as possibilidades de seu instrumento para além de qualquer amarra de gênero, homem de linhagem nobre dentro da MPB com o raro dom de fazer do erudito algo popular, Raphael Rabello faleceu a 27 de abril de 1995, aos 32 anos. Seus feitos, apesar de registrados no correr de uma existência tão curta, foram tamanhos em gigantismo que o tempo só faz por torná-los mais impressionantes – mesmo que atualmente tenhamos em atividade incontornáveis fenômenos das sete cordas, como Alessandro Penezzi e Yamandu Costa, permanece único, e inalcançável, o misto de perfeccionismo, elegância, detalhismo compulsivo, temperamento que bailava do tranquilo ao eruptivo ao sabor das notas tocadas, e a obsessão em ser o melhor, mais jamais contentar-se com apenas isso, que Rabello mesclava como ninguém.


Selecionamos alguns momentos marcantes do saudoso músico, para celebrar uma vida fulgurante, multifacetada, e guiada por um talento sobrenatural.

Pra começar, algo que, embora também possua valor artístico, funciona mais como curiosidade na maiúscula trajetória de Rabello: aos 24 anos, bastante requisitado por sambistas de variadas vertentes, e ainda creditado nos encartes como “Rafael”, ele participou de um álbum solo de Mussum! Confira o disco de 1986 na íntegra:


Encontramos diversos vídeos de Raphael em parceria com outros artistas, porém esse com Armandinho é especial. Não apenas por o sidekick da vez possuir impressionantes habilidades (e que em momento algum se avexa perante aquele que já à época era considerado um dos maiores violonistas já surgidos em nosso país), mas a fluidez do instrumental e a interação quase que brincalhona entre ambos, com os sorrisos de Rabello demonstrando que ali encontrara um comparsa à altura, revela música tornada estado de alma, que nos traz congraçamento, leveza e esperança:


Agora, um vídeo diferente: Raphael Rabello descontraído em uma reunião de amigos, entre conversas informais e goles de cerveja, assistido por pessoas (o violonista e colecionador mineiro Pascoal Guimarães entre eles) que provavelmente já haviam se acostumado a suas mágicas irrupções como uma frugal manifestação do dia-a-dia mais corriqueiro, e mostrando de início alguns exercícios de aquecimento para depois mandar números dificílimos com o despojamento que a ocasião exigia. Gênios também relaxam? É provável – mas, mesmo em seus momentos despretensiosos, um gênio permanece um gênio:


Por último, um dos vídeos que considero mais impressionantes disponíveis na Internet. Como uma orquestra de um só homem, Rabello rege a si mesmo em sete minutos de uma performance que demonstra na própria carne o “som e fúria” do soneto de William Shakespeare: no reduzido espaço de uma canção, evidencia-se toda a tempestade emocional que a execução de uma peça provocava em seu espírito; a busca pela perfeição, que pode ser tão cruel, combinada ao maravilhamento de alcançar o que se havia pretendido a princípio, para, meros segundos depois, procurar ser ainda mais sublime do que nos instantes anteriores, e assim prosseguir até o fim. Esse vulcão interno que aflora sem disfarces, esse evidente fascínio pelo ofício de músico e a seriedade com que Raphael o encara, a técnica exuberante ganhando cada vez mais corpo com o decorrer do tema, a ambiência que torna a apresentação em um evento praticamente teatral e faz do violonista um insuspeito performer… Está tudo aí:

Deixe um comentário